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endoftalmia ocular por candida albicans

quarta-feira, 10 de junho de 2009
Os fungos são os agentes mais comuns na endoftalmite endógena, representados na sua maioria pelas espécies de Candida.

Infecções por Candida têm sido observadas desde os tempos de Hipócrates, que descreveu a doença em pacientes debilitados.

A endoftalmite resultante da infecção sistêmica por Candida foi inicialmente descrita em um olho enucleado em 1943(1). Em 1958, foi relatado o primeiro caso clinicamente reconhecido como endoftalmite endógena por Candida, confirmado posteriormente por necropsia(2).

Até a metade do século vinte, poucos casos de endoftalmite fúngica endógena foram relatados, porém, na década de sessenta, um grande número de trabalhos foi publicado a respeito, fato este que coincidiu com a introdução dos antibióticos de largo espectro(3). Os fatores que contribuíram para o aumento da incidência de endoftalmite fúngica endógena nas últimas décadas incluem a difusão da antibioticoterapia, hiperalimentação intravenosa, terapia imunossupressiva, além do aumento da sobrevida dos pacientes imunocomprometidos, inclusive aqueles portadores da síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS)(4). Após 1975, foram estudados um total de 167 casos descritos em 52 diferentes publicações(3). Aproximadamente um terço dos casos teve envolvimento bilateral. As condições predisponentes foram similares àquelas relatadas antes de 1975, porém, associações com usuários de drogas ilícitas, prematuridade e AIDS são mais comumente encontradas nos relatos atuais(5). As características dos achados oculares combinados com os achados clínicos e cultura positiva para Candida extra-ocular foram consideradas diagnósticas na maioria dos casos. Pelas descrições, as espécies de Candida, principalmente a C. albicans, foram as principais responsáveis por estas infecções fúngicas.

A C. albicans é um habitante normal do trato gastrointestinal e regiões mucocutâneas, incluindo boca e vagina. Por ser um organismo que habita normalmente o corpo humano, culturas de sangue positivas são freqüentemente atribuídas à contaminação, o que pode levar a um atraso no diagnóstico de uma infecção por Candida.

Imunossupressão, debilidade orgânica, entre outros fatores, podem tornar o fungo patogênico, resultando em uma grave infecção sistêmica(6).

O uso de drogas endovenosas ilícitas é a causa mais comum de endoftalmite fúngica endógena. Os pacientes são tipicamente jovens saudáveis, a não ser pela história de uso abusivo de drogas endovenosas ilícitas, dado este que dificulta o diagnóstico preciso(7).

Acredita-se que a origem da infecção fúngica, nestes casos, seja o suco de limão usado para diluição da diacetil-morfina (heroína). As culturas destas drogas isoladas foram negativas para Candida e trabalhos relatam ainda que a heroína teria um efeito fungicida(8).

Usuários de heroína podem desenvolver uma síndrome distinta de candidíase, que se apresenta como: nódulos cutâneos, osteomielite, osteocondrite e endoftalmite. Os sintomas oculares são evidentes dez dias após o uso da injeção intravenosa de heroína. As culturas de Candida mostram-se positivas nas amostras de pele e cartilagem costal, porém são negativas no sangue e urina(9). Diferentes tipos de ácido desoxirribonucléico (DNA) de cepas de C. albicans podem ser encontrados nas epidemias de endoftalmite fúngica em usuários de diacetil-morfina(10).

Os antibióticos intravenosos têm sido associados a infecções por Candida desde 1945(11). As bactérias que normalmente habitam a flora intestinal, inibem o crescimento da população de fungos. Alterando-se a flora bacteriana intestinal com o uso de antibióticos sistêmicos, os fungos têm a possibilidade de crescer e invadir tecidos profundos, vasos sangüíneos e linfáticos, resultando em uma doença disseminada, principalmente nos indivíduos imunocomprometidos. Associações com cirurgias gastro-intestinais e uso de antibioticoterapia sistêmica são fatores de risco para o aparecimento da endoftalmite fúngica endógena(12).

A relação entre cateteres intravenosos e candidemia tem sido abordada por diversos autores(13-15). Nestas situações, os pacientes estão geralmente em regime de hiperalimentação e mantidos com cateteres intravenosos por longos períodos como informa, por exemplo, o estudo no qual 133 pacientes faleceram com fungemia documentada, sendo que 32 (24%) destes pacientes estiveram em regime de hiperalimentação antes do óbito(16). Outros autores descreveram que 100% dos pacientes com fungemia tinham cateteres intravenosos(17).

A imunossupressão, causada por doença sistêmica ou induzida por terapia imunossupressiva, é outro fator associado a infecções sistêmicas por Candida(18-20). Na maioria dos casos, estes pacientes imunossuprimidos receberam antibióticos de largo espectro e tiveram cateteres intravenosos, aumentando assim, o risco desta infecção. Estudos de fungemia adquirida em hospital mostraram que 11 (14%) de 77 pacientes com fungemia eram portadores de doenças malignas e três casos (3,8%) foram submetidos a transplante de órgãos(17). Outro estudo demonstrou que cerca de um terço dos pacientes possuía doenças malignas e 58% receberam quimioterapia(16).

A AIDS é fator de risco para o desenvolvimento de candidíase(5,21). Apesar da candidíase mucocutânea ser muito comum nos pacientes portadores de AIDS, a candidíase disseminada é infreqüente. Este fato pode ser explicado por ser a infecção sistêmica por Candida comum em indivíduos com neutropenia, enquanto a candidíase mucocutânea ocorre nas alterações da imunidade mediada por células. Por esta razão, a endoftalmite por Candida em pacientes com AIDS, sem história de uso de drogas ilícitas, é rara. Um caso de endoftalmite endógena por Candida foi relatado em um paciente com defeito específico de imunidade celular para este fungo(22).

O papel dos corticosteróides como fator predisponente de candidíase é incerto devido ao fato destes pacientes freqüentemente terem outros fatores associados. A hidrocortisona parece não interferir na atividade fungicida dos neutrófilos(23).

Com relação às manifestações clínicas e à epidemiologia das infecções fúngicas disseminadas em prematuros de muito baixo peso, estes podem apresentar-se com: temperatura corporal instável, hiperglicemia, dificuldade respiratória, distensão abdominal e hipotensão(24-25). Freqüentemente, estas crianças são tratadas com nutrição parenteral, uso de cateteres e antibióticos de largo espectro. As culturas são negativas na maioria destes prematuros e o diagnóstico é usualmente baseado no aspecto fundoscópico.

Outros fatores predisponentes menos comuns de candidíase sistêmica e endoftalmite endógena por Candida são: puerpério(26), insuficiência hepática(3), alcoolismo(15), manipulação genito-urinária(27), procedimentos neurocirúrgicos(28), megacólon tóxico(29), aborto induzido(30), neutropenia(31), transplante de medula óssea(32-33) e idiopática(34).

Vários estudos exploraram a relação de candidemia e endoftalmite. Autores relataram que 30% dos pacientes com candidemia tinham evidências clínicas ou após o óbito de endoftalmite por Candida(35). Foram analisados, em estudo retrospectivo, 77 pacientes com fungemia e observou-se que 11 (14,2%) apresentavam sinais de endoftalmite(17).

Trabalho prospectivo em 27 pacientes com fungemia por C. albicans apresentou endoftalmite em 37% dos casos (10 pacientes)(36). Apenas 1 (9%) em 11 pacientes com fungemia por Candida de outra espécie desenvolveu endoftalmite, o que confirma outros relatos anteriores da alta patogenicidade da C. albicans quando comparada a outras espécies(37).

ACHADOS CLÍNICOS

A endoftalmite fúngica apresenta-se na grande maioria dos casos como uma infecção de caráter indolente. Os sintomas mais comumente encontrados na infecção intra-ocular por Candida são: embaçamento visual, dor e fotofobia. A dor mostra-se menos intensa quando comparada à forma bacteriana, fato este que dificulta o seu diagnóstico. Os pacientes podem ainda apresentar queixa de pontos flutuantes no campo de visão. Indivíduos extremamente debilitados podem não apresentar sintomas. O envolvimento bilateral ocorre em cerca de um quarto dos casos de endoftalmite endógena e é caracterizado pela similar gravidade, embora possa ocorrer intervalo de dias entre o aparecimento dos sinais em ambos os olhos. O sinal oftalmológico mais característico de endoftalmite por Candida é a lesão branca, pouco delimitada, envolvendo a coróide e retina, localizada no pólo posterior. A lesão pode ser única ou múltipla e apresentar um aspecto estrelado semelhante àquele observado nas infecções fúngicas corneanas. Hemorragias intra-retinianas podem circundar a lesão branca, levando ao aspecto das “manchas de Roth”. As opacidades vítreas são tipicamente branco-amareladas e conectadas por traves, produzindo uma imagem semelhante a um “colar de pérolas”. A origem destas opacidades foi primeiramente descrita em1964(38) e posteriormente em 1980(39), como uma gradual elevação da lesão retiniana que finalmente se rompia e migrava em direção ao vítreo. Outros sinais comuns, mas menos característicos, são: injeção conjuntival e ciliar, precipitados ceráticos, células inflamatórias na câmara anterior, com ou sem hipópio. Episclerite, esclerite, membrana pupilar, membrana ciclítica, edema do nervo óptico e perivasculite são também descritos. Alterações do segmento posterior como: membrana epirretiniana, tração vitreorretiniana e descolamento de retina podem ocorrer nas fases tardias da doença(40).

Após a fase aguda da infecção, as lesões da retina e coróide evoluem com cicatrizes fibrosas, tendo sido descrita a ocorrência de membranas neovasculares de coróide no local da cicatriz(41). Nos olhos com intensa inflamação vítrea, as típicas lesões coriorretinianas podem ser obscurecidas pela opacidade vítrea. Estes casos ocorrem com mais freqüência nos pacientes usuários de drogas ilícitas pelo fato destes procurarem auxílio médico nas fases tardias da infecção.

HISTOPATOLOGIA

A histopatologia da endoftalmite por Candida foi descrita inicialmente em um caso diagnosticado por necrópsia(1). Edwards et al. (1974) apresentaram um grande número de casos com relatos histopatológicos(19). As típicas lesões coriorretinianas apareciam macroscopicamente como elevações brancas de superfície lisa, algumas vezes circundadas por hemorragia. Microscopicamente, as lesões eram compostas por uma inflamação supurativa envolvendo a coróide e estendendo-se para a retina. Os organismos estavam tipicamente concentrados próximos ao lado interno da retina destruída. Descolamentos serosos da retina foram observados. Mais da metade dos casos relatados tinham papilite associada.

Apesar dos fungos não terem sido encontrados na coróide e retina, eles foram relatados dentro de nódulos vítreos circundados por leucócitos polimorfos nucleares. Ocasionalmente, linfócitos e células plasmáticas foram encontrados, porém sem evidências de inflamação granulomatosa.

O envolvimento do segmento anterior é um achado incomum no exame histopatológico, porém pode haver comprometimento do corpo ciliar, conjuntiva e esclera(42). Os autores demonstraram um denso infiltrado mononuclear do limbo, íris, corpo ciliar e coróide, com elevação da retina perivascular e necrose retiniana.

MÉTODOS DIAGNÓSTICOS

A endoftalmite por Candida deve ser suspeitada em todos os pacientes com os fatores predisponentes já supracitados que apresentem coriorretinite ou uveíte posterior progressiva. A presença das típicas lesões coriorretinianas brancas ou das opacidades vítreas em “colar de pérolas” é altamente sugestiva.

O diagnóstico presuntivo de endoftalmite endógena deve ser feito se as culturas de Candida em outros locais apresentarem-se positivas na presença de um quadro ocular característico. A Candida pode ser obtida através da cultura de urina, sangue, ou outros locais como cateteres endovenosos, semanas antes do aparecimento dos sintomas oculares(43). Na ausência de culturas positivas de Candida de locais extra-oculares ou sinais oculares inespecíficos com envolvimento vítreo, opta-se pela biópsia e cultura do humor vítreo para confirmação diagnóstica. O reconhecimento da causa do processo inflamatório intra-ocular, estéril ou infeccioso, e a determinação do agente etiológico através de estudos de sensibilidade são fundamentais no tratamento da endoftalmite. O vítreo é o principal sítio intra-ocular de alojamento dos organismos. A presença do cristalino, cápsula posterior ou lente intra-ocular não previne a invasão da cavidade vítrea pelos microrganismos. Autores demonstraram experimentalmente que o segmento anterior possui uma maior resistência aos agentes invasores em relação ao segmento posterior(44). Os autores inocularam uma grande quantidade de organismos na câmara anterior de coelhos e não foram capazes de induzir um quadro de endoftalmite progressiva. O inverso ocorreu quando uma pequena quantidade de germes foi introduzida na câmara posterior e produziu infecção intra-ocular. Usando modelos animais, estudos confirmaram o diagnóstico em 62% dos olhos com aspiração do humor vítreo e relataram a aspiração do humor aquoso como sendo de pouco valor diagnóstico(45). Apesar do baixo grau de positividade das culturas obtidas do humor aquoso, a possibilidade, ainda que remota, dos organismos serem encontrados na câmara anterior torna a obtenção deste material recomendável.

A coleta das amostras do humor vítreo pode ser realizada através da punção via pars plana com agulha fina ou com o auxílio do vitreófago(46). Nos casos suspeitos de etiologia fúngica, recomenda-se a vitrectomia diagnóstica no intuito de colher a maior concentração possível de fungos, pois os mesmos situam-se seqüestrados na cavidade vítrea, diferentemente das colônias de bactérias que se apresentam de forma difusa no corpo vítreo. A amostra do vítreo, se diluída nos líquidos de infusão da vitrectomia, deve ser filtrada por centrifugação ou com filtros de papel (milipore). O material obtido da câmara anterior e posterior deve ser imediatamente inoculado nos meios de cultura apropriados e colocado em lâminas para coloração e observação microscópica(47).

A Candida é uma levedura que se apresenta na forma de micélio e hifa, porém mantém a morfologia de hifa na maioria das vezes, exibindo a característica de pseudomicélio em certos ambientes nutricionais.

Os métodos clássicos para detecção e identificação de leveduras do gênero Candida e da espécie Candida albicans são divididos em métodos para visualização e recuperação fúngica e testes para identificação de leveduras. A visualização do fungo é possível através do uso de técnicas de coloração específicas, nas quais a levedura pode ser identificada por observação microscópica direta. Dentre os corantes usados destacam-se: Gram, Giemsa, prata Gomori, hidróxido de potássio, branco calcoflúor, entre outros. Estes fungos crescem rapidamente em quase todos os meios de cultura, mas o ágar Sabouraud com ciclohexamida em temperatura ambiente e o meio BHI (brain heart infusion) a 36 graus são os mais recomendados quando o organismo é clinicamente suspeito. Na ausência dos meios apropriados, o material pode ser diretamente inoculado em frascos com ágar sangue. Colônias esbranquiçadas aparecem em 24 a 48 horas após a inoculação(43).

São testes para identificação de leveduras: prova de assimilação de fontes de carbono e nitrogênio, provas de fermentação, teste de tubo germinativo, resistência à ciclohexamida, testes de termotolerância, estudo morfológico em ágar fubá com Tween 80, hidrólise da uréia e produção de fenoloxidase. Estes testes resultam num perfil bioquímico-nutricional específico, permitindo a diferenciação entre as espécies de leveduras, especialmente as do gênero Candida. Nenhuma das provas de identificação de fungos apresenta sensibilidade e especificidade de 100%; portanto, os métodos tradicionais de visualização e recuperação são recomendados em qualquer laboratório que pretenda identificar espécies de leveduras(48).

A ultra-sonografia ocular é útil na detecção de envolvimento do segmento posterior e na monitorização da evolução do processo infeccioso. São descritos ecos de baixa refletividade e alta mobilidade no vítreo, grandes vacúolos intravítreos e espessamento da hialóide posterior na maioria dos casos. No estudo ultra-sonográfico(49), o descolamento de coróide foi determinado como fator de mau prognóstico visual nos pacientes portadores de endoftalmite.

Novos métodos diagnósticos têm sido testados nos últimos anos para a detecção precoce das infecções fúngicas. Dentre eles, citamos: uso de marcadores moleculares para identificação de fungos nos tecidos humanos(50), a reação da cadeia de polimerase(10), dosagens séricas e vítreas de D-arabinitol, beta-D-glucan e do antígeno de C. albicans(51), uso de anticorpos monoclonais radioiodinizados(52) e dosagem de anticorpos IgG no humor aquoso(53). Os novos métodos descritos acima abrem novas perspectivas diagnósticas, porém necessitam de maiores estudos.

TRATAMENTO

Apesar do desenvolvimento de novos agentes antifúngicos, das vias alternativas de administração e dos avanços na cirurgia vitreorretiniana, o tratamento da endoftalmite fúngica ainda se constitui num desafio para a oftalmologia.

A anfotericina B é o antifúngico de eleição no tratamento da endoftalmite por Candida. Ela foi descoberta em 1956(54) e utilizada no tratamento da candidíase e endoftalmite em 1960(55). É um dos vários antibióticos polienos e, devido às suas duplas ligações, é chamada de heptaeno polieno.

O composto atua ligando-se aos esteróis da membrana celular, resultando num extravasamento dos constituintes celulares e morte celular(56). É uma substância fungistática e fungicida isolada de cepas de Streptomyces nodosus. Seu espectro de ação inclui todas as espécies de Candida, algumas espécies de Aspergillus, Blastomyces dermatitidis, entre outros fungos. A droga não é absorvida pelo trato gastrointestinal e deve ser administrada por via intravenosa. O tratamento sistêmico, em doses de 0,25mg/kg a 1,5mg/kg ao dia, é geralmente indicado nos casos de candidíase associada à coriorretinite sem opacidades vítreas(57).

A vitrectomia via pars plana e a injeção intravítrea de 5 a 10mg de anfotericina B são as opções terapêuticas nos casos de opacidades vítreas moderadas ou graves(58). Existindo a associação com candidemia, o uso da anfotericina B intravenosa está indicado. Nos casos de opacidades vítreas leves, sem associação com candidemia, considera-se somente o tratamento com injeções intravítreas da droga(59).

Mesmo sendo a anfotericina B, atualmente, o antifúngico mais eficaz disponível, seu uso é restrito pela sua toxicidade sistêmica e local. A disfunção renal é o mais importante efeito tóxico e ocorre na grande maioria dos pacientes. É usualmente reversível quando cessada a terapia, porém reduções permanentes na filtração glomerular podem permanecer. Os valores do hematócrito, potássio sérico, uréia nitrogenada do sangue, creatinina e dióxido de carbono, bem como análises da urina, devem ser obtidos quinzenalmente. Efeitos colaterais, como: distúrbios gastro-intestinais, febre, calafrios, tromboflebite, hepatotoxicidade, neurotoxicidade, reações alérgicas e parada cardíaca, podem ocorrer durante a infusão rápida da droga(60).

Apesar da anfotericina B ser usualmente eficaz, infecções intra-oculares persistentes têm sido relatadas nos casos de envolvimento vítreo(35,42). Especula-se que níveis subterapêuticos intravítreos, alcançados quando a droga é administrada por via endovenosa, sejam os responsáveis pelo fracasso terapêutico nos casos descritos. Foi demonstrada, em trabalho experimental, a presença de fungos na retina, coróide e vítreo de coelhos inoculados com cepas de Candida e tratados vinte e oito dias com anfotericina B endovenosa(61). Observou-se histologicamente a presença de organismos viáveis em um paciente portador de endoftalmite fúngica tratado com repetidas doses de anfotericina B endovenosa(62). Injeções intravítreas de 5 a 10mg podem eventualmente causar necrose retiniana se administradas próximas à retina ou injetadas de forma rápida(63).

A natamicina (pimaricina) pertence à mesma classe e apresenta o mesmo espectro de ação da anfotericina B. Infelizmente, sua capacidade de penetrar no vítreo é pequena e estudos demonstraram ser uma droga altamente tóxica quando injetada no vítreo(64-65).

A nistatina é um fungistático e fungicida isolado de cepas de Streptomyces noursei. Seu espectro de ação e mecanismo são semelhantes aos da anfotericina B, porém é altamente tóxica quando usada por via sistêmica ou intravítrea(66).

A fluorocitosina foi descoberta em 1957 e usada no tratamento da candidemia em 1968. A vantagem da fluorocitosina sobre a anfotericina B é a sua excelente absorção gastrointestinal. Os efeitos colaterais mais comuns são a diarréia, náusea e vômitos. São relatados também trombocitopenia, anemia e leucopenia. A penetração vítrea da fluorocitosina após a administração oral é satisfatória(67-68). Entretanto, seu maior problema é a alta porcentagem de resistência das cepas de Candida. Entre 7 e 47% das cepas de Candida isoladas antes do tratamento eram resistentes à droga e a sua resistência geralmente ocorre durante o tratamento(69). Em estudo experimental, autores relataram que a fluorocitosina, droga que apresenta alta porcentagem de resistência a C. albicans, poderia ser administrada nas doses de até 100mg, sem efeitos tóxicos para a retina(70).

Nos últimos anos, novas séries de compostos imidazoles têm sido estudados.

Os imidazoles são menos tóxicos que os antibióticos polienos e eficazes contra várias espécies de fungos. O clotrimazol foi o primeiro imidazole estudado, porém sua capacidade de induzir enzimas microssomais do fígado limitou seu uso sistêmico(71). O miconazol é um dos dois imidazoles disponíveis para administração sistêmica. É pouco absorvido pelo trato gastrointestinal e deve ser administrado por via intravenosa. A dosagem recomendada para o tratamento das espécies de Candida é de 600 a 3600mg/kg ao dia(72). Este antifúngico apresenta uma concentração inibitória mínima in vitro relativamente alta para a maioria das espécies de Candida, além de apresentar baixa penetração vítrea quando administrado por via intravenosa(73). Estes dados explicariam o seu fracasso no tratamento da endoftalmite endógena por Candida encontrado na literatura(74).
Os efeitos colaterais mais comuns são: tromboflebite, arritmia, anafilaxia, parada respiratória, febre, calafrios, entre outros. Devido a sua limitada ação antifúngica contra Candida e a sua baixa penetração vítrea, sua indicação é restrita a casos de cepas resistentes ao tratamento com anfotericina B. Autores demonstraram que injeções intravítreas de 40mg de miconazol não apresentaram evidências de toxicidade para a retina de coelhos albinos(75).

O cetoconazol é um imidazole aprovado como antifúngico sistêmico em 1981. Atua inibindo os esteróis da membrana celular, porém difere do miconazol por ser bem absorvido pelo trato gastrointestinal(76). A dose de 200 a 800mg/kg ao dia é variável de acordo com o tipo de infecção que se pretende tratar(77). Apresenta uma baixa porcentagem de efeitos tóxicos graves. São relatados náuseas, vômitos e diarréia. Foram reportados casos de disfunção hepática variando de elevação assintomática das enzimas até necrose hepática fatal(78). O cetoconazol possui uma excelente ação in vitro e in vivo contra a maioria das espécies de Candida. Entretanto, sua penetração intravítrea e eficácia no tratamento da endoftalmite por Cândida são motivos de controvérsia na literatura. Acredita-se que, para o tratamento ser eficaz, o antifúngico deva ser administrado por longos períodos (79). O cetoconazol está indicado nos casos de coriorretinite presumida por Candida sem associação com candidemia ou nos pacientes severamente debilitados que não podem receber a anfotericina B intravenosa. O cetoconazol não produziu alterações tóxicas na retina de coelhos nas dosagens intravítreas de até 550mg (80), assim como seu análogo, o oxiconazol, nas doses de 100mg(81).

Os triazoles são novos derivados azoles que, além de possuir as mesmas propriedades dos imidazoles, lesam os fosfolipídios da membrana celular, o que confere a eles novas propriedades antifúngicas. O itraconazol é ativo contra uma variedade de fungos, entre eles, as espécies de Candida. É bem absorvido por via oral em doses de 50 a 400mg ao dia. Apresenta baixa toxicidade, com relatos de náusea e aumento transitório de enzimas hepáticas(82). O fluconazol apresenta alta eficácia contra espécies de Candida e vários outros fungos. Pode ser administrado por via oral na dosagem de 200 a 400mg ao dia ou, menos freqüentemente, por via intravenosa e apresenta a melhor farmacocinética entre todos os antifúngicos estudados(83). Sua toxicidade é semelhante à do itraconazol, porém sua atividade in vivo ainda permanece controversa devido à baixa penetração na cavidade vítrea dos compostos imidazoles(84).

O uso de fluconazol intravítreo na dosagem de 100mg(85) e itraconazol 10mg(86) não produziu efeitos tóxicos retinianos em modelos experimentais.

NOVAS OPÇÕES TERAPÊUTICAS

Baseando-se nos dados relativos às limitações dos diversos antifúngicos disponíveis e nos princípios da terapia intravítrea, desenvolveram-se estudos de novos antifúngicos.

O cilofungin, de alta eficácia in vitro contra C. albicans, apresentou-se não tóxico para a retina(87), assim como o faerifungin, um novo agente antifúngico de atividade restrita contra C. albicans, não apresentou alterações no ERG e na microscopia óptica e eletrônica nas doses intravítreas de até 100mg(88).

Dentre os mais recentes antifúngicos estudados, destaca-se a espartanamicina B, que se mostrou segura e eficaz na dosagem intravítrea de 10mg em modelos experimentais de endoftalmite por Candida albicans(89-90).
Autores descreveram o uso de injeções intravítreas de dexametasona associada à anfotericina B no tratamento da endoftalmite experimentalmente induzida por C. albicans(91). Os autores compararam o tratamento com injeções intravítreas de apenas anfotericina B e observaram que os coelhos tratados com corticosteróides, além da cura do processo infeccioso, evoluíram com o desaparecimento das opacidades vítreas iniciais. Os coelhos tratados somente com anfotericina B obtiveram a cura da endoftalmite, porém, permaneceram com opacidades vítreas residuais. Estudos posteriores também apresentaram resultados satisfatórios com a associação de corticosteróides e antifúngicos(92-93).

Apesar da grande variedade de antifúngicos disponíveis, nota-se que a maioria destes compostos apresentam problemas relacionados à toxicidade sistêmica e ocular, farmacocinética, penetração vítrea e eficácia. Estudos futuros são necessários objetivando encontrar novas formas de tratamento para endoftalmite por C. albicans.

Prebióticos e Probióticos

segunda-feira, 8 de junho de 2009
Por diversas vezes temos recebido alguns e-mails com perguntas sobre alimentos prebióticos e probióticos. No que consistem ao certo? Existem diferenças entre prebióticos e probióticos? Quais?
Comecemos então por explicar melhor estas designações. «Prebióticos» são alimentos que contêm substâncias não digeríveis que nos oferecem um efeito fisiológico benéfico. Ou seja, certos alimentos podem conter elementos (nutrientes) que estimulam de forma selectiva a actividade ou o crescimento de bactérias benéficas existentes naturalmente no nosso organismo. Se pensarmos que no nosso intestino vivem milhões de bactérias e que necessitamos delas para que o nosso aparelho digestivo e sistema imunitário funcionem correctamente, vemos que estes elementos prebióticos podem ser uma ajuda importante. Os prebióticos são sobretudo fibras, como a inulina ou a oligofrutose. E não pense que estas substâncias são «artificiais» e usadas apenas para «enriquecer» bolachas, cereais, lacticínios e também leites ou papas próprias para bebé. A natureza também os usa: os oligossacáridos presentes no leite materno são um importante prebiótico que ajuda o bebé a desenvolver a sua flora intestinal, no período delicado após o nascimento!
Já os «probióticos» são alimentos que contêm quantidades suficientes de microrganismos vivos, capazes de produzir benefícios para o nosso organismo. Ou seja, os prebióticos continham substâncias «inertes» que os microrganismos benéficos existentes no nosso corpo aproveitavam, enquanto os probióticos fornecem os próprios microrganismos benéficos. Entre os microrganismos benéficos mais conhecidos encontram-se aqueles que usamos há milhares de anos para fermentar o leite e assim produzir leites fermentados como o kefir. Os lactobacilos e as bifidobactérias são bons exemplos de microrganismo probióticos. O que a indústria alimentar moderna fez foi analisar as diversas estirpes de microrganismos existentes nestes leites fermentados (são bastantes e muito diversas nas suas características) e seleccionar aquelas com mais benefícios para o funcionamento do nosso corpo. Surgiram assim os iogurtes com tipos de bífidos que ajudam regularizar a flora intestinal ou os leites fermentados com certos lactobacilos que reforçam o efeito de barreira imunológica do intestino. A este respeito, convém ainda mencionar que para um alimento ser probiótico não deve apenas conter os ditos microrganismos benéficos – é preciso que estes cheguem ao corpo em quantidade e condições para actuar correctamente. Por isso, estes produtos são conservados na zona do frio de modo a preservar os microrganismos, usados em concentrações elevadas.
Portanto, da próxima vez que ouvir falar em «bichinhos» adicionados aos alimentos ou quando lhe disserem que estas «invenções» são coisas modernas e que «fazem mal» já sabe: os «bichinhos» existem no nosso corpo há milhões de anos e há já muitos séculos que os consumimos com benefícios para a saúde…